Texto publicado no Jornal Arquitetos / IX Congresso Nacional de
Arquitetura, Pavilhão Bienal – Ibirapuera, São Paulo.
Desenho Industrial exige adequação de currículo
O desenho
industrial necessita da formação humanística e técnica dos cursos de arquitetura
para que possa realizar as quatro dimensões necessárias ao produto final:
forma, função, estrutura e produtividade, esta ultima tendo em vista a
metodologia da racionalização e a economia industrial.
No entanto, para
que o arquiteto não seja marginalizado enquanto desenhista industrial pela
regulamentação desta profissão, é necessário que haja uma adequação dos
currículos das escolas de arquitetura às exigências do próprio desenho
industrial.
Esta é a
preocupação do arquiteto Vicente Bicudo, há 11 anos na CTE, projetou a poltrona
vendida pela Teperman e usada em muitos auditórios; poltronas de ônibus, avião,
tratores, de metrôs no exterior como o Bart de San Francisco e o de Washington
e o estudo da Nava Shuttle da NASA. Em seu depoimento, ele faz um apelo ao IX
Comgresso para que permaneça alertado para o problema.
Bicudo explica:
"Atravessamos
no Brasil uma fase de transição da construção artesanal à industrialização.
Começamos a viver com o pré-moldado e pré-fabricado e, à medida que a
mão-de-obra encarecer, não teremos outra saída senão a industrialização do
elemento construtivo. Mas nunca a industrialização das construções poderá ser
confundida com a industrialização do projeto.
"Para o
futuro, creio que haverá dois grandes arquitetos: aqueles que trabalham na
indústria, projetando objetos e elementos construtivos e aqueles que trabalham
em escritórios, projetando suas obras a partir de elementos industrializados
fornecidos pelo primeiro grupo. Haverá arquitetos que criarão letras e todo um
alfabeto, formarão palavras, sentenças, períodos e toda uma obra que,
dependendo da criatividade de cada um, poderá ser trajédia, comédia e também
uma obra de arte.
"A
tendência da arquitetura vem seguindo uma linha natural e nesse processo de
desenvolvimento lembro que em 1962, na FAUUSP, o professor Artigas
oportunamente conceitua que, tendo em vista a adequação à profissão e às
necessidade do desenvolvimento nacional, o ensino de desenho industrial deveria
ser feito através dos cursos de arquitetura onde há formação humanística e
técnica.
"A
arquitetura na USP começou na Escola Politécnica que, estruturada a partir do
modelo da Poli francesa, formava engenheiros navais, metalúrgicos, civis,
arquitetos, etc. Em 1952 desmembrou-se criando a FAUUSP, com especialização em
urbanismo e edificações e, após a reforma de ensino de 1962, comunicação visual
e desenho industrial.
"Quando em
1969 dirigindo a FAU de São José dos Campos, dividi o campo de especialização
do arquiteto em planejamento (planejamento, urbanismo e paisagismo) edificações
e objetos: três diferentes escalas que se completam na mesma metodologia de
projetação.
Solicitação
"A
indústria brasileira, na fase inicial, não solicitou o desenhista industrial,
visto que o produzido era vendido. Objetivava-se copiar o similar importado.
"Com o
surgimento da competição industrial a superprodução e a guerra da propaganda
pelos crescentes meios de comunicação, as indústrias de produtos consumidos por
mulheres - então mais suscetíveis aos apelos da televisão e das revistas -
solicitaram os desenhistas industriais.
"Mais
recentemente, as indústrias de móveis, rádios, vitrolas, televisores,
vasilhames, brindes, geladeiras, fogões, artefatos de plástico e brinquedos
entraram em uma pura competição, consciente, de desenho industrial. Após a fase
de elaboração dos produtos, enfrentamos agora a etapa das embalagens. Aqui um
grupo maior de indústrias que têm seus produtos vendidos pelas crescentes
cadeias de supermercados, onde a embalagem substitui o balconista, passa a
solicitar o desenho industrial. Estes são os campos em que o desenhista
industrial tem atuado no Brasil.
"A maioria
das indústrias ainda não desenvolve produtos, copiando ou redesenhando
timidamente, numa etapa primária de industrialização - transição da produção em
série com custos mais baixos por unidade - não podendo pretender conquistar o
mercado, ampliá-lo e muito menos pensar em exportar.
"A
indústria da construção civil inicia sua participação no processo de
industrialização, com desenhistas industriais desenvolvendo telhas, forros,
paredes divisórias, caixilharias, armários embutidos, luminárias, maçanetas.
hoje, temos firmas especializadas em setores completos - como escritórios,
cozinha e banheiros.
"Na maior
parte das indústrias ainda persiste o equívoco entre o desenhista industrial e
o engenheiro de produto, como aqui houve entre arquiteto e engenheiro civil.
Pensa-se no desenhista industrial como arquiteto de fachada, ao qual dava-se um
prédio todo, projetado, pedindo-lhe para mudar a fachada para uma mais bonita,
como se isso bastasse para torná-lo um projeto arquitetônico perfeito. O
desenho industrial é um processo que incorpora a técnica. Ele vai do início ao
fim do desenvolvimento, solicitando diferentes técnicos. E o final não é a soma
dos trabalhos, mas do produto dos confrontos e da cooperação daqueles que nele
intervieram.
Formação
"Hoje, no
Brasil, a formação de desenhistas industriais está a cargo de dois diferentes
cursos, em decorrência das cargas horárias e currículos mínimos estabelecidos
pelo MEC: os que recebem formação a partir dos cursos ligados às Artes
Plásticas têm sido levados a uma concepção do produto em duas dimensões: forma
e função, enquanto os formados através dos cursos de Arquitetura - pela origem
desses cursos estar ligada a engenharia - conseguem ampliar o seu enfoque,
acrescentando-lhe, além da forma e da função, uma terceira, a estrutura. Isto
ainda deixa a desejar, uma vez mesmo que o Desenho do Objeto só pode ser
corretamente concebido a partir de quatro dimensões: forma, função, estrutura e
produtividade, esta ultima tendo em vista a metodologia da racionalização,
marketing e a economia industrial.
"É preciso
lembrar que a colocação do desenho industrial como uma profissão a ser formada
pelos cursos de arquitetura determina a evolução do próprio conceito da
edificação e dando uma formação humanística e técnica ao ensino do Design,
evita o Styling.
"A este
Congresso Nacional de Arquitetos, espero que se alerte para a adequação dos
currículos das escolas, para que na regulamentação da profissão do desenhista
industrial não se marginalize o arquiteto."
Jornal
Arquitetos / IX Congresso Nacional de Arquitetura